25 de maio de 2011

Um PhD e a Agricultura

Houve um tempo em que os terrenos que me ficaram porque a Mãe morreu tinham vinhas e pomares e searas. A Mãe morreu. A agricultura morreu. Os terrenos estão lá. Entrei neles pela primeira vez o ano passado. Eu. Dona. Herdeira. Estrangeira ali em chão que não me reconhece. Falta-me decidir, antes do final do ano agrícola (que acaba em Setembro e eu não sabia mas ando a aprender), que projecto ali vou fazer. Falo com o engenheiro agrónomo que me vai ajudar e o que ouço é devastador. A agricultura em Portugal é um cadáver.
- Oliveiras! - Sugiro entusiasmada, pensando em hectares de árvores verde prateado e azeite liso aveludado. Andei a ler sobre oliveiras. Sei as espécies. Sei as diferentes variantes da cultura e sei quantas árvores um hectare sustenta.
- Oliveiras?! Era bom. Mas os espanhóis compraram o Alentejo e é impossível competir com eles. - Diz-me na seriedade de quem sabe do que fala.
- Vinha? - Replico lembrando-me das nossas vinhas de quando eu era pequena e comia grossos bagos de Dona Maria e produzíamos castas híbridas vinícolas. - Os terrenos já tiveram vinha, podíamos lá fazer um vinhedo outra vez.
- O investimento é monstruoso e não compensa produzir para a Adega Cooperativa. Aliás, já nem sequer temos muitos sócios e, como vê, as vinhas estão todas por amanhar.
- Searas?
- Ó Dona Blonde, agora vem tudo da América do Sul. Um hectare na Amazónia compra-se por nada. Aqui os custos de produção cerealífera subiram 300% e o preço de venda de trigo desceu de tal ordem que o seu Pai nos anos 80 vendia o trigo que produzia a 30 escudos o quilo e se agora o vendesse a 4 cêntimos teria sorte. Não vê que até a EPAC fechou? Quem é que receberia os cereais?
Fico parva pelo tanto que as coisas mudaram nestes anos em que virei as costas ao passado. Estamos a pensar num plano para transição para agricultura biológica. Talvez cereais. Entretanto descobri umas coisas sobre pastagens biológicas e ainda lhe vou sugerir isso. A ver o que ele diz. Agora que quero agarrar os terrenos, a determinação continua. Mas continuo na perplexidade de ver o ponto a que as coisas chegaram. Ninguém fala em políticas agrícolas neste país. Os terrenos viraram matos. Há um ordenamento do território que cria reservas agrícolas nacionais, sítios de silvas e abandonos. Como é que poderíamos não estar em crise? O CDS fala na Lavoura e as Esquerdas proclamam o regresso à agricultura. Mas só oiço intenções. Ninguém assume rumos, estratégias ou políticas. Ninguém sabe como ressuscitar a agricultura.
Eu continuo a pensar, a ler e a pesquisar. Há-de-me surgir uma ideia para resgatar aqueles terrenos e encontrar-me em paz com passados. Pena tenho é que para isso tenha de lutar contra um país que desprezou a terra de onde vem e o pó para onde vai... 

10 comentários:

João Afonso Machado disse...

Vá por mim. O tema é do que mais me interessa.
Como dá para perceber que a área á frande, ponha lá perdizes. Milhares de perdizes. Com comedouros para andarem sempre bem tratadas. O resto não tarda a bater-lhe à porta: pessoas cvilizadas que gostam de caçar e respeitam as regras que lhes impuser. E pagam. Pagam bem.

Mais perto do seu cantinho, se o clima deixar, ponha frutos silvestres: framboesa, mirtilo... Qualquer hiper lhe compra produção.

Se se interessar a sério: ervas aromáticas. Estão a sair muito bem.

Se gostar de crianças: quintas pedagógicas. É só dar um pouco de lustre à tralha agrícola que lá deve encontrar e fazer um galinheiro, uma chocadeira, coisas que traz do seu laboratório.

Torço por isso. Tivesse eu algo de meu...

A.B. disse...

É claro que não vai ser atar e pôr ao fumeiro, e pode dizer adeus à Universidade, o tempo não lhe vai chegar, só para a lavoura. O Sr. João Afonso Machado deu boas sugestões, investigue porque em 99% dos casos não funcionam...

A.B. disse...

Ah, e parabéns. Três anos de ausência de vida em comum dão direito a divórcio sem grandes complicações. Está quase terminado o seu não-casamento (mas não entendo a expressão, cabe quase tudo, cabem quase todas as desgraças num casamento).

hc disse...

Há cada vez mais gente a fazer agricultura biológica com qualidade, agricultura como sempre se fez desde que o mundo é mundo. Só depois da II Guerra Mundial é que se inventou a desgraça da comida cheia de pesticidas, químicos e venenos que entram no nosso corpo constantemente... Basta ir aos mercados biológicos, que já são bastantes, para encontrar informação e possibilidades de formação. BOA SORTE!

António de Almeida disse...

Li há dias que a framboesa está em alta, exportamos a que produzimos, e mais houvesse... Depois a agricultura biológica ou algum nicho de mercado, mas não percebo nada do assunto...

antonio ganhão disse...

Um dia destes temos a Blonde de boné numa feira agrícola... impressionado me confesso.

Dias as Cores disse...

Decide-te e depois fazemos uma sociedade!;)

Dias as Cores disse...

...Ah e parabéns pelo texto! Belo, tal como grande parte deles! É um privilégio podermos lê-los de graça!

Jorge de Castro disse...

Com a actual política agrícola, o que é verdade hoje é falso amanhã! Sou de opinião, hoje, que ainda se pode fazer muito bom vinho e azeite em Portugal, mas implica investimentos altos, custos de produção baixos, para que seja possível obter bons produtos baratos e ficar bem colocado em termos de competividade. Outra possibilidade ainda lucrativa, é vedar tudo e fazer gado bovino para carne, só com pastagem; se as terras forem boas e a área suficiente, o retorno é rápido, e desde que tenha quotas, bastante atractivo.

Rute CS disse...

Tens toda a razão! Deixámos perder-se este país que tanto teve de rural...